segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Na memória tem o mesmo olhar sobre ele, mas agora percorre outra rua, e a nova porta tem uma chave em forma de coração. Só que, invariavelmente, também na memória, desemboca na mesma mesa de madeira tosca, e sente a superfície irregular onde há marcas de copos e cheiro de histórias de quem sonhou e falou demais. Pensa nas vezes em que o vinho se entornou no meio das palavras, e nos pastéis de massa irrepreensivelmente folhada, saboreados com risos, lágrimas e espantos. E sente as almas iguais, mas os corpos separados por um largo mar e uma dor funda no peito.

Caminha até encontrar um "lugar seguro", onde decide tomar um café expresso, porque a espuma lhe recorda que a vida se desfaz rapidamente. Bom é saboreá-la enquanto dura.

Olha o céu. Fica presente ao brilho das estrelas, antes que seja tarde e as nuvens regressem. Sabe que lá em cima é como cá em baixo - nascemos e morremos a cada instante.

domingo, 6 de setembro de 2015

Ele tem o olhar no sinal do ombro dela e o nariz com farinha. Está a mastigar de boca aberta, obviamente deliciado.

E diz ela:

"Olha aí, não te babes!"

E riu-se, com o seu riso claro e a luz nos olhos de quem vê a alma do outro.

A manhã, clara e luminosa, envolvia os dois. Não existia mais ninguém no mundo, com certeza.

Rosa continuava a observar o companheiro, divertida, pensando que as horas melhores da nossa vida são as dos prazeres simples. E perguntou:

"Que ser és tu afinal, a comer com esses modos?"

E diz ele:

"Ó Rosinha, estou assim porque este pão a estalar com manteiga sabe à tua pele!"

E o sol iluminou-lhes mais os beijos.

quinta-feira, 3 de setembro de 2015

É bom quando te sentas no jardim a tomar um café, escutas os risos da casa ao lado, e trocas olhares amistosos com um gato cinzento, enquanto outro, preto e branco, desfila no muro de pedra à tua frente. Ouves a voz de uma criança,

"Tia, morreu ali um pássaro bebé, eu vi!"

Outro gato, de riscas, a ouvir tudo no fundo do jardim, e eu a magicar no que vai e no que fica, na Morte que entra na Vida distraída, a espreguiçar-se, por exemplo, sob um magnífico céu de fim de tarde como este. Instantes impressos nos dias que se desvanecem e passam depressa, depressa...

Escuto novamente aquela voz infantil, o tema já é outro,

"O que é o Amor? Eu gostava de saber, é melhor perguntar à mamã!"

O menino tem a certeza que a mãe, que rega as flores, lhe vai dar uma resposta. E dá,

"O Amor é uma coisa que se abre lentamente, como as flores na Primavera!"

Dias simples.