sexta-feira, 5 de maio de 2017

Em Abril as cerejas ficam à janela para que as admirem. Em Maio, saltam para o cesto e são de quem as apanhar. As favas também escolhem o quinto mês do ano para nos fazerem felizes, especialmente se fizermos sopa com elas. Ou se as misturarmos num puré perfumado de coentros. "Tira a camisa às favas", pede a minha mãe. E eu tiro, sempre a pensar que sem camisa é que é bom. "Sem camisa e com cerejas", digo baixinho, que a minha mãe é surda ou faz-se, ainda não percebi. "Lava as cerejas, que se põe já uma taça delas em cima da mesa". E eu faço tudo o que a minha mãe me diz - aqui em casa, porque fora dela vou apanhar cerejas sem camisa e são favas contadas.

"Concentra-te mulher, olha a hora!"

Toca a campaínha e eles vão chegando. São os beijinhos e as perguntas do costume, frutos que colhemos o ano inteiro, pois ainda aqui estamos todos, prontos para fazer da casa da Mãe o Centro do Mundo. E lá está uma grande taça de cerejas e conversas, que vamos tirando sem parar. A velocidade do pensamento abranda nestas horas de conversa morna e comida boa, é como uma meditação, preciosa para a nossa humanidade, a tal que deve prevalecer sobre o ritmo frenético para o qual nos chama o Mundo. Para não entrarmos em modo permanentemente acelarado, devemos dar espaço e tempo à intimidade. Só assim somos autênticos, que é uma coisa muito bonita de se ser.

Poder sentir e saborear a presença dos que me são tão queridos, a cor e o gosto da fruta madura, as nuvens carregadas no ar de Maio, lembra-me que tudo muda, tudo passa. Só o Amor permanece. E nós, os humanos, precisamos de Amor para aceitar a impermanência das coisas.



(fotografia de Darryl Jones - 500px)

2 comentários:

  1. Ai amiga que me emocionei tanto... <3 Que palavras lindas. Levaram-me direta ao coração. Grata por este momento!

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  2. Amo-te Joana! Há partilhas que não cabem nas palavras!

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